A última descendente de D. Benta que possuiu a Quinta de Balasar foi D. Maria José Carneiro da Grã Magriço, esposa do Visconde de Azevedo e filha do último casal acima mencionado.
Entrada da Quinta da Espinheira
D. Maria José nasceu a 6 de Agosto de 1804, na Póvoa de Varzim, na Casa dos Carneiros. Casou em 1827, um tempo muito pouco pacífico.
O casal, que era riquíssimo, foi mais tarde agraciado com o título de visconde por D. Maria II.
É curioso que, sendo uma mulher muito abastada, com numerosas propriedades em dois distritos, D. Maria José Carneiro da Grã Magriço quis ser sepultada em Balasar: dispôs no testamento que o seu corpo fosse “envolvido em hábito de Santa Teresa (de Ávila), encerrado em caixão de chumbo e sepultado no jazigo da família que tem na freguesia de Balasar, deste concelho, onde repousam os restos mortais de sua mãe” (a D. Francisca de que se falou).
É sem dúvida sua mãe que o P.e Domingos da Soledade Silos menciona quando fala duma D. Francisca que tem a seu cargo a Capela da Lapa.
Contrariamente ao que dispôs no testamento, D. Maria José Carneiro da Grã Magriço não foi sepultada em Balasar, antes em Barcelos, “por a autoridade administrativa do Porto se opor a que fosse para Balasar, conforme era vontade da testadora”.
À sua morte, esta senhora deixou 400$000 para serem repartidos pelos pobres e miseráveis da vila da Póvoa de Varzim; outros 400$000 ao Hospital, mais 300$000 à Misericórdia. Deixou ainda 100$000 para os pobres de freguesias onde tinha propriedades, caso de S. Simão da Junqueira, Balasar e Lama.
Isto vem no jornal poveiro “Facho da Verdade”, em 7.1.1886.
O edifício do Instituto de S. José, em Vila do Conde, também foi propriedade da Viscondessa de Azevedo.
A Quinta de Balasar ainda ficou mais alguns anos na posse de parentes dos Viscondes, que não tiveram filhos, mas depois foi vendida a um lavrador.
Palácio dos Viscondes de Azevedo, no Porto.
O Visconde de Azevedo (Vila Verde, 21/01/1809 - Porto, 25/12/1876) não viveu à sombra dum nome feito pelos antepassados: foi antes um homem com intervenção activa no seu tempo. Interveio, ainda jovem, nas lutas liberais, ao lado dos realistas, interveio depois de passagem na política e foi sobretudo um sábio bibliófilo. Foi célebre a sua livraria. Seguindo Camilo, “tinha a singularidade fenomenal de ser sábio e rico”. Foi sócio correspondente da Academia de Ciências de Lisboa e colaborador do Dicionário Bibliográfico de Inocêncio. Este dicionário é um monumento da cultura portuguesa.
Vejam-se ainda estas palavras que Camilo sobre ele escreveu:
“Era um homem de bem. Para lhe chamarem nas gazetas facínora, caipira, besta e ladrão, foi necessário que governasse o distrito de Braga em 1845. Desde que esquivou, na poltrona da sua biblioteca, o osso sacro aos pontapés da política, volveu a ser, por comum assentimento de todos os partidos, um espírito recto, muito esclarecido e digno de exercer os cargos superiores do Estado”.
O Visconde de Azevedo tinha residências no Porto e Póvoa de Varzim, e naturalmente outras. No Porto e na Póvoa, reunia cenáculos culturais[1]. Na casa do Porto, possuiu uma tipografia particular onde chegou a fazer imprimir algumas raridades bibliográficas em tiragens limitadas.
Escreveu alguma prosa de ficção, alguma poesia e artigos de apreciação crítica, traduziu Vergílio e Cervantes. Ajudou a salvar a Gramática da Linguagem Portuguesa, de Fernão de Oliveira, primeira gramática da nossa língua, publicada originalmente em 1536, e que ele republicou em edição limitada.
Este visconde mereceu recentemente um artigo na Biblos, Enciclopédia Verbo das Literaturas de Língua Portuguesa.
Católico esclarecido, prefaciou o importante livro de Camilo A Divindade de Jesus, onde o escritor refutava a blasfema Vida de Jesus, da autoria de Renan.
É curioso que tenha dirigido Cartas ao redactor da Gazeta de Portugal, refutando o que, a respeito da mesma Vida de Jesus, escrevera Pinheiro Chagas em artigo publicado na mesma Gazeta.
Final do prefácio do Visconde de Azevedo a A Divindade de Jesus de Camilo Castelo Branco. Este livro saiu em 1865, ano da Questão Coimbrã.
Esta pretensa biografia quis negar a divindade de Jesus Cristo homem e Deus. Eça de Queirós e outros deram-lhe grande crédito, embora se trate de um trabalho sem rigor científico.
Recorde-se a propósito que o livro de Renan é referido, com destaque, pelo Dr. Dias de Azevedo na polémica que teve com o médico vila-condense Dr. Pacheco Neves.
O Visconde de Azevedo pronunciou um discurso na Assembleia dos Oradores e Escritores Católicos no Palácio de Cristal, em 1 de Janeiro de 1872. Veja-se uma citação desse discurso, transcrita dum trabalho de D. Manuel Clemente, bispo do Porto:
“Bem sei que não falta quem tenha dito que esta nossa reunião era inútil e desnecessária por isso que os ministros sagrados do culto aí estavam todos os dias pregando dentro dos nossos templos as coisas da religião, tornando-se assim escusado o vir escutá-las aqui. É exactamente por esse dito que estas reuniões me parecem necessárias e utilíssimas: no século passado Voltaire, chefe dos incrédulos do seu tempo, para ridicularizar a religião católica chamava-lhe a religião dos Padres, e os seus discípulos desde então até hoje não se têm esquecido de lhe dar a mesma denominação; pois […] eu afirmo que é tudo pelo contrário, que a religião católica não é a religião dos Padres, mas os Padres é que são da religião católica […]; é portanto coisa evidente que, sendo a religião, a Igreja Católica, e os Padres coisas coevas na sua fundação e criação por Jesus Cristo, não são aquelas que derivam destes, mas sim estes que derivam daquelas… ”
O Google colocou em linha as Distracções Métricas do Visconde de Azevedo.
Já perto do final da vida estes viscondes ascenderam a condes.
Um soneto do Visconde de Azevedo:
A existência de Deus
Essa dos altos céus magnificência,
A terra, o ar, o fogo, o mar salgado,
O tempo inquieto e o espaço sossegado,
De um Criador proclamam a existência.
Em vão descrê e nega esta evidência
Filósofo atrevido e desvairado,
Que a si mesmo e a tudo o mais criado
Busca no cego acaso a prima essência!
Todos os seres, toda a natureza
Mostram Autor eterno e sábio e forte,
Que o vício odeia e que a virtude preza.
Mas a sempre infeliz humana sorte
Faz que somente a um Deus nega ou despreza
Quem deve inda viver além da morte!
[1] Cerca duma semana após a morte do Visconde de Azevedo, escrevia, em 2 de Janeiro de 1877, o seu amigo, Conde de Samodães n’ A Palavra: “O nobre conde de Azevedo teve muitos e verdadeiros amigos e a sua casa era um centro onde eles se congregavam, para em agradável colóquio discutirem entre si assuntos, a que a murmuração era estranha”.
Entrada da Quinta da Espinheira
D. Maria José nasceu a 6 de Agosto de 1804, na Póvoa de Varzim, na Casa dos Carneiros. Casou em 1827, um tempo muito pouco pacífico.
O casal, que era riquíssimo, foi mais tarde agraciado com o título de visconde por D. Maria II.
É curioso que, sendo uma mulher muito abastada, com numerosas propriedades em dois distritos, D. Maria José Carneiro da Grã Magriço quis ser sepultada em Balasar: dispôs no testamento que o seu corpo fosse “envolvido em hábito de Santa Teresa (de Ávila), encerrado em caixão de chumbo e sepultado no jazigo da família que tem na freguesia de Balasar, deste concelho, onde repousam os restos mortais de sua mãe” (a D. Francisca de que se falou).
É sem dúvida sua mãe que o P.e Domingos da Soledade Silos menciona quando fala duma D. Francisca que tem a seu cargo a Capela da Lapa.
Contrariamente ao que dispôs no testamento, D. Maria José Carneiro da Grã Magriço não foi sepultada em Balasar, antes em Barcelos, “por a autoridade administrativa do Porto se opor a que fosse para Balasar, conforme era vontade da testadora”.
À sua morte, esta senhora deixou 400$000 para serem repartidos pelos pobres e miseráveis da vila da Póvoa de Varzim; outros 400$000 ao Hospital, mais 300$000 à Misericórdia. Deixou ainda 100$000 para os pobres de freguesias onde tinha propriedades, caso de S. Simão da Junqueira, Balasar e Lama.
Isto vem no jornal poveiro “Facho da Verdade”, em 7.1.1886.
O edifício do Instituto de S. José, em Vila do Conde, também foi propriedade da Viscondessa de Azevedo.
A Quinta de Balasar ainda ficou mais alguns anos na posse de parentes dos Viscondes, que não tiveram filhos, mas depois foi vendida a um lavrador.
Palácio dos Viscondes de Azevedo, no Porto.
O Visconde de Azevedo (Vila Verde, 21/01/1809 - Porto, 25/12/1876) não viveu à sombra dum nome feito pelos antepassados: foi antes um homem com intervenção activa no seu tempo. Interveio, ainda jovem, nas lutas liberais, ao lado dos realistas, interveio depois de passagem na política e foi sobretudo um sábio bibliófilo. Foi célebre a sua livraria. Seguindo Camilo, “tinha a singularidade fenomenal de ser sábio e rico”. Foi sócio correspondente da Academia de Ciências de Lisboa e colaborador do Dicionário Bibliográfico de Inocêncio. Este dicionário é um monumento da cultura portuguesa.
Vejam-se ainda estas palavras que Camilo sobre ele escreveu:
“Era um homem de bem. Para lhe chamarem nas gazetas facínora, caipira, besta e ladrão, foi necessário que governasse o distrito de Braga em 1845. Desde que esquivou, na poltrona da sua biblioteca, o osso sacro aos pontapés da política, volveu a ser, por comum assentimento de todos os partidos, um espírito recto, muito esclarecido e digno de exercer os cargos superiores do Estado”.
O Visconde de Azevedo tinha residências no Porto e Póvoa de Varzim, e naturalmente outras. No Porto e na Póvoa, reunia cenáculos culturais[1]. Na casa do Porto, possuiu uma tipografia particular onde chegou a fazer imprimir algumas raridades bibliográficas em tiragens limitadas.
Escreveu alguma prosa de ficção, alguma poesia e artigos de apreciação crítica, traduziu Vergílio e Cervantes. Ajudou a salvar a Gramática da Linguagem Portuguesa, de Fernão de Oliveira, primeira gramática da nossa língua, publicada originalmente em 1536, e que ele republicou em edição limitada.
Este visconde mereceu recentemente um artigo na Biblos, Enciclopédia Verbo das Literaturas de Língua Portuguesa.
Católico esclarecido, prefaciou o importante livro de Camilo A Divindade de Jesus, onde o escritor refutava a blasfema Vida de Jesus, da autoria de Renan.
É curioso que tenha dirigido Cartas ao redactor da Gazeta de Portugal, refutando o que, a respeito da mesma Vida de Jesus, escrevera Pinheiro Chagas em artigo publicado na mesma Gazeta.
Final do prefácio do Visconde de Azevedo a A Divindade de Jesus de Camilo Castelo Branco. Este livro saiu em 1865, ano da Questão Coimbrã.
Esta pretensa biografia quis negar a divindade de Jesus Cristo homem e Deus. Eça de Queirós e outros deram-lhe grande crédito, embora se trate de um trabalho sem rigor científico.
Recorde-se a propósito que o livro de Renan é referido, com destaque, pelo Dr. Dias de Azevedo na polémica que teve com o médico vila-condense Dr. Pacheco Neves.
O Visconde de Azevedo pronunciou um discurso na Assembleia dos Oradores e Escritores Católicos no Palácio de Cristal, em 1 de Janeiro de 1872. Veja-se uma citação desse discurso, transcrita dum trabalho de D. Manuel Clemente, bispo do Porto:
“Bem sei que não falta quem tenha dito que esta nossa reunião era inútil e desnecessária por isso que os ministros sagrados do culto aí estavam todos os dias pregando dentro dos nossos templos as coisas da religião, tornando-se assim escusado o vir escutá-las aqui. É exactamente por esse dito que estas reuniões me parecem necessárias e utilíssimas: no século passado Voltaire, chefe dos incrédulos do seu tempo, para ridicularizar a religião católica chamava-lhe a religião dos Padres, e os seus discípulos desde então até hoje não se têm esquecido de lhe dar a mesma denominação; pois […] eu afirmo que é tudo pelo contrário, que a religião católica não é a religião dos Padres, mas os Padres é que são da religião católica […]; é portanto coisa evidente que, sendo a religião, a Igreja Católica, e os Padres coisas coevas na sua fundação e criação por Jesus Cristo, não são aquelas que derivam destes, mas sim estes que derivam daquelas… ”
O Google colocou em linha as Distracções Métricas do Visconde de Azevedo.
Já perto do final da vida estes viscondes ascenderam a condes.
Um soneto do Visconde de Azevedo:
A existência de Deus
Essa dos altos céus magnificência,
A terra, o ar, o fogo, o mar salgado,
O tempo inquieto e o espaço sossegado,
De um Criador proclamam a existência.
Em vão descrê e nega esta evidência
Filósofo atrevido e desvairado,
Que a si mesmo e a tudo o mais criado
Busca no cego acaso a prima essência!
Todos os seres, toda a natureza
Mostram Autor eterno e sábio e forte,
Que o vício odeia e que a virtude preza.
Mas a sempre infeliz humana sorte
Faz que somente a um Deus nega ou despreza
Quem deve inda viver além da morte!
[1] Cerca duma semana após a morte do Visconde de Azevedo, escrevia, em 2 de Janeiro de 1877, o seu amigo, Conde de Samodães n’ A Palavra: “O nobre conde de Azevedo teve muitos e verdadeiros amigos e a sua casa era um centro onde eles se congregavam, para em agradável colóquio discutirem entre si assuntos, a que a murmuração era estranha”.
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